A primeira vez que eu ouvi a palavra ecologia foi mais ou menos em 1974. Eu tinha 8 anos e participava do Movimento Bandeirante (versão feminina do escotismo no Brasil, hoje em dia um nome politicamente incorreto). A mãe de uma colega tinha acabado de voltar de uma pós-graduação nos Estados Unidos e pediu para conversar com as crianças. Sentamos no chão em roda para ouvir sobre a fragilidade dos ecossistemas e a falta de sensatez da espécie humana. Eu não lembro o nome dessa mulher e provavelmente e ela provavelmente nunca soube como a conversa foi importante para mim.
Com a memória daquele momento e querendo retribuir o que recebi, tomei gosto por sentar no chão e conversar com crianças sobre questões ambientais. Em geral elas entendem o X da questão melhor e mais rápido que os adultos. Já faz uns anos que participo de muitos mutirões de plantio e os voluntários com frequência levam seus filhos, o que é excelente, já que para as próximas gerações vai sobrar a tarefa da regeneração dos ecossistemas.
Então, inspirada pelo mestre Joseph Campbell (sim, aquele de “O Poder do Mito”), no evento seguinte resolvi propor uma “Oficina de Guardiões da Natureza”. Foi quando, junto com os parceiros Nik Sabey, Ricardo Cardim, Sergio Reis, Diego Lahoz, Sergio Shigeeda e mais um montão de plantadores, criamos a primeira floresta de bolso no Parque Cândido Portinari (julho de 2016). A proposta era conversar sobre a importância da natureza enquanto criávamos bonecos de argila, os “Guardiões da Natureza”, que teriam a missão de cuidar das árvores plantadas para elas crescerem saudáveis e cuidarem de nós. Foi um sucesso. E sugiram depois mais oportunidades para realizar a oficina. Sobretudo quando a querida Adriana Ferla Machado, arteeducadora e amiga, se juntou à “equipe”.
A oficina é uma ação simples que contém a essência da mensagem ambientalista: a interdependência entre todas as formas de vida. (As crianças já devem estar cansadas de tanta aula expositiva e tanta falação dos adultos. Então a atividade prescinde de muitas palavras e se torna mais ou menos um meditação coletiva. O contato com os materiais naturais, sobretudo a argila, acalma e acolhe os pensamentos e sensações.)
Gostou da ideia e quer organizar uma Oficina de Guardiões da Natureza? Aqui vão as dicas:
- A única coisa que precisa comprar é argila de boa qualidade. As que normalmente são vendidas em papelaria vêm misturadas com cola e areia. Veja as marcas que a Adriana recomenda: http://www.pascoalmassas.com.br/, http://www.hobbyceramica.com.br/materias_primas.html, https://www.ceramicanovafarias.com.br/ . Já fizemos oficinas com argila boa e argila ruim e pode acreditar que faz diferença. Mas se não encontrar dessas, use qualquer uma. Um quilo para cada seis ou oito pessoas mais ou menos é suficiente.
- Recolha com antecedência gravetos, folhas e flores secas, sementes. O exercício de sair por aí catando essas coisas é uma delícia e e muito inspirador.
- Em relação às sementes, só use milho e soja se forem comprovadamente não transgênicos (para garantir, orgânicos). Os guardiões são deixados na natureza e muitas sementes brotam. Não queremos correr o risco de espalhar por aí DNA transgênico.
- Estenda um tecido no chão e espalhe os gravetos, folhas e sementes. Vá cortando a argila com um pedaço de barbante e deixe preparado para distribuir um pedaço para cada um (mas só abra a argila na hora, para não ressecar).
- Reúna as crianças e convide também os adultos (eu, por exemplo, adoro fazer uns Guardiões). A explicação é simples: “Agora vamos criar Guardiões da Natureza. Eles podem ter qualquer forma, o importante é moldá-los com a intenção de proteger a natureza . E só use materiais naturais e compostáveis — nada de plástico ou outras sucatas. Depois que o Guardião estiver pronto, você vai escolher um lugar que é especial para você e colocá-lo na terra. Pode ser um parque, praça, floresta, quintal, horta ou até um vaso. O Guardião ficará lá protegendo as plantas e outros seres que vivem no local. E as plantas e os outros bichinhos vão proteger a gente, pois é a natureza que nos oferece o que mais precisamos para viver: ar, água, alimento.”
- Aí deixe rolar. Cada um no seu tempo. Algumas crianças em princípio são mais tímidas. Muitas preferem trabalhar em silêncio, o que é até melhor, pois esse é um momento de conexão com a natureza. Respeite o clima de contemplação. Quem quiser fazer vários pode. Quem quiser sair logo também. O Guardião pode até ficar enfeitando a casa por um tempo. A única coisa que proibida é jogar no lixo. Eles precisam ir para a terra e se decompor até misturar com ela.
- Essa oficina vai muito bem inclusive em locais totalmente desnaturalizados (fechados, com luz artificial, sem jardim etc). É só chegar com a argila, os gravetos, folhas e sementes que a energia da natureza vem junto. É como se carregássemos um fragmento de floresta, com a vida em suas diversas etapas, da semente à terra e da terra à semente. No final, não existe lixo (tudo será compostado) e o consumo é praticamente nulo (se você encontrar um fundo de rio de onde retirar argila, nada será comprado).
- O resultado artístico costuma ser incrível. E a experiência é melhor ainda!